12 de jul. de 2009

O Despertar (5° Parte)


Kália acordou com o riso fora de sua tenda. Era um som conhecido que sempre a reconfortava. Era o riso de suas irmãs em volta da fogueira partilhando o jantar ou historias. Em sua vida aprendera a somente relaxar quando cercada por aquelas que combatiam a seu lado e sabe-las deixava sua mente livre para planejar seus próximos passos.
Eles viriam, ela estava certa disso. Uma coisa que aprendera ao longo dos anos é que estes fora-da-lei simplesmente não se contentavam no que pudessem por suas mãos. Queriam tudo. Nunca podiam respeitar os limites dos muros, dos cadeados e da lei.
Kália usou a água que alguém gentilmente havia deixado para se lavar e colocou suas peças de couro mais grosso, apesar de vários remendos ainda ajudavam a aliviar muitos golpes. Por cima de tudo vestiu uma malha fina de metal que lembrava muito às dos cavaleiros da antiguidade. Saiu da tenda e logo o cheiro de guisado de carne a atingiu fazendo seu estomago roncar. Fazia dias que não comiam carne, a viagem até ali fora longa e nos últimos dias haviam comido somente arroz com legumes desidratados. Estava faminta. Suas irmãs a receberam com um prato cheio e um copo de vinho encorpado produzido ali mesmo na cidadela que ela não demorou a secar.
“Já pensou como quer agir quando eles vierem?” Perguntou Cami, a mais nova com 20 anos, ainda sedenta de ação.
“Não devem ser muitos. Dez como nós, no máximo 15. Assim que soubermos por onde atacam saímos e atacamos com força total. Eles já mataram muitas cabeças e levaram parte da safra de arroz da aldeia, não quero esperar que façam mais estrago. É quase inverno e esse lugar é muito próximo da cordilheira, logo não vão poder mais plantar.”
“Qual a ordem? Capturar ou eliminar?” Perguntou Helene que já estivera em muitas missões com Kália.
“Não vejo porque captura-los, sabemos o que fizeram e quando voltarem saberemos que pretendiam continuar o saque. Não estou com paciência para levar um bando de degenerados até a casa da irmandade mais próxima. Isso exigiria vigílias por todas as noites e atenção constante durante a viagem. Votamos? Quem for a favor de não fazermos prisioneiros levante sua espada.”
Onze espadas, de Kália inclusive, se ergueram no ar e o assunto estava decidido sem mais uma palavra. Em um mundo brutal, ainda jovem nesta sua segunda edição após sua quase destruição, não havia espaço para pensar na recuperação de indivíduos que realmente não pareciam interessados em preservar o que haviam duramente conseguido recuperar. Alem do mais dificilmente haveria alguém disposto a largar sua própria sobrevivência para tentar incluí-los numa sociedade que os recusaria assim soubesse de seu passado.
As guerreiras terminaram sua refeição e tomaram seus postos. Kália ficou na casa da torre ao lado do portão principal, olhando a noite e estudando seus contornos.
“Senhora?”
Kalia se virou com a mão na espada para encontrar a jovem Analice parada à porta com um jarro e um prato nas mãos.
“Nunca chegue assim de mansinho por trás de uma guerreira, menina, pode se machucar.”
“Desculpe. Vim lhe trazer suco de limão e um pedaço de torta de morangos. Eu mesma fiz.” Analice colocou sua oferenda sobre a mesa da pequena sala e voltou à sua posição sob o umbral da porta.
“Vá para casa menina. Essa noite é bom ficar abrigada, nunca se sabe o que pode acontecer.” Kália sempre se incomodava com crianças por perto, não sabia como lidar com elas.
“Sim, senhora, mas queria lhe dar isso. Minha mãe diz que protege.” E Analice estendeu à Kália uma fina corrente com uma cruz de madeira. A cruz era lindamente talhada, pequena e perfeitamente polida.
“Sua mãe sabe que você pegou isso?”
“Sim, senhora. Eu pedi a ela.” A garota respondeu ruborizando.
“Olha garota, não tenho tempo agora. Obrigada pela oferta, vou usar mas somente por essa noite. Sei pela sua cara que deve ter pego sem autorização. Fica entre nós, mas amanhã você devolve de onde tirou, ok?”
“Sim, senhora.”
A garota se oi tão silenciosa quanto chegou. Diabos se não daria uma boa guerreira com pés tão leves, mas Kália nunca quisera uma aprendiz. Não seria ela a tirar uma filha de sua casa. Já vira vezes demais isso dar errado para querer tentar.
Continua...
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Um comentário:

Anônimo disse...

É quase impossivel impedir minha imaginação de visualizar teus contos; a vida e a força que eles tem.
Fantástico