9 de jul. de 2009

O Despertar (3° Parte)


Analice observava Kália atentamente. Procurava guardar cada gesto, o modo de andar, a mão pousada levemente sobre o punho da espada, os cabelos curtos voando livres ao vento, a cicatriz que cortava o rosto que deveria ter sido belo demais. Era uma linha fina que lembrava um raio, começava acima de sua orelha direita e descia até o canto de sua boca lhe dando um ar perpetuamente sarcástico. Analice nunca vira ninguém tão bela.
“Que tanto olha, garota?” Kália sabia exatamente o que, mas gostava de testar as meninas que tanto queriam sua vida.
“Sua cicatriz. Dói?”
“Não. Não agora, mas durante anos doeu e muito.” Admirou que a garota fosse honesta em sua curiosidade. Poucos eram. O poder da irmandade era muito para ser recebido com franqueza.
“Você chorou quando te machucaram?” a menina continuou a perguntar, mas baixando os olhos. Parecia ter perdido o medo, mas a timidez havia voltado.
“Claro que chorei. Doeu muito, mais ainda quando limparam meu ferimento. Parecia que meu rosto todo estava pegando fogo.” Kália se aproximou da menina que acariciava o arco sem perceber.
“Você prefere o arco ou a espada?”
“A espada.” Respondeu Kália sentando ao lado da garota. “Mas o arco já me salvou muitas vezes, ele pode parar o inimigo quando ainda está longe e se forem muitos é uma vantagem abate-los antes que cheguem a você.”
“Porque somente as filhas de guerreiras podem ser guerreiras? Não acho justo...” Analice deixou escapar antes de pensar, mas Kália somente riu.
“Seria mesmo injusto se fosse verdade. “
“Não é? Mas todos dizem...” Analice estava surpresa.
“As pessoas falam o que acreditam ser verdade, mas isso não torna verdadeiras suas palavras. É somente mais comum que filhas de guerreiras sigam os passos das mães, mas temos muitas entre nós que vieram de vilas como você e muitas que nasceram dentro da irmandade que se casam, tem filhos e vivem dentro dos muros como você.”
“Então eu poderia ser uma guerreira?” Perguntou Analice vislumbrando um novo mundo à sua frente.
“Não é tão simples assim, mas sim, poderia. Dentro de certas circunstancias poderia. E agora vamos voltar que logo anoitece e preciso me reunir com minhas irmãs para decidir o que fazer.”
Kália não queria dizer à menina que somente poderia fazer parte da irmandade, sendo que não nascera nela, se fosse escolhida por uma guerreira para ser sua aprendiz. Nunca quisera esta responsabilidade e não começaria agora quando tinha tantas duvidas. As famílias geralmente se sentiam honradas quando suas filhas trilhavam este caminho, mas não todas. Não aquelas onde as filhas eram peças importantes na sobrevivência da família, quando seu par de mãos fazia diferença na hora de colher e na hora de tratar dos animais.
Continua...
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Um comentário:

Anônimo disse...

Pareço estar familiarizado com este conto()?
Fantástico como conduz a sua obra Andréa.
Very Good!!!