6 de fev. de 2008

Depois da Escuridão (Parte 7)

A praça parecia pequena para o numero de combatentes. As guerreiras foram aos poucos exterminando cada um daqueles que ousaram não fugir. Meu pai lutava ao lado de minha mãe como um louco e eu, escondida em sua oficina os via com olhos maravilhados. Pareciam deuses banhados pela luz daquele entardecer.
Por um acaso do destino os dois se viram separados do resto das guerreiras e cercados por muitos homens. Eles então deram-se as costas, encostando-se um ao outro em busca de proteção. Vi como trocavam palavras apressadas que me pareceram desesperadas e meu coração se comprimiu como se já soubesse o que eu iria presenciar. Os homens caíram sobre eles e vi minha mãe ser agarrada e jogada ao solo enquanto meu pai lutava para chegar até ela. Ela não foi somente assassinada, em poucos segundos pouco sobrava dela que fosse reconhecível. Meu pai gritava e brandia sua espada, mas era já tarde demais. Meu pobre coração se quebrou e eu agarrei a espada que meu pai fizera com carinho como presente de inverno para minha mãe e me lancei à luta.
Talvez Deus proteja os inocentes ou talvez os insanos tenham uma força vinda do desespero, o fato é que eu lancei a terra cada homem do bando que cruzou meu caminho. Minha espada, a espada de minha mãe, entrava em seus corpos com facilidade e eu sentia uma alegria imensa a cada vez que isso acontecia. Meu pai gritava para que eu retrocedesse, mas não havia volta.
O destino deu suas cartas novamente e desta vez nos sorriu, o jogo virou e logo nos vimos rodeados de guerreiras. A luta terminou. Tudo terminou..
Um grupo de guerreiras saiu no encalço dos que fugiram e voltaram uma semana depois com rostos cansados, corpos doloridos, roupas em farrapos e espadas sujas de sangue. Cada um deles havia sido caçado e nossos mortos haviam sido vingados, mas isso me deu pouca alegria. Enterramos nossos mortos em uma espécie de letargia, era como se já não fossemos nós mesmos, mas sim espectros vagando por lugares conhecidos em uma vida que nunca retornaria. Meu pai murchou ante meus olhos e talvez não tenha enlouquecido completamente pois eu ainda vivia, mas eu tinha que lembra-lo constantemente disso.
Entrei para a guilda na mesma noite que as guerreiras voltaram de sua caçada. Meu pai chorou de tristeza e de orgulho na noite em que realizamos os ritos de minha admissão, mas não protestou, já não havia força nele para isso. Ele me presenteou com a espada que eu manchara de sangue mal saíra da forja e me disse palavras que levei em meu coração pelo resto da vida.
“Honre sua mãe e sua guilda. Não deixe que o sangue que manchou esta espada manche também sua alma. A conserve limpa e afiada e faça o mesmo com sua mente. Leve para sempre a lembrança de que seus pais para onde for, mas nunca se lembre deles em sua hora mais negra. Pense em mim e nas horas que passamos na forja e lembre-se de sua mãe como a luz de nossas vidas. Você já não me pertence, assim como ela nunca me pertenceu, mas eu sempre serei seu até depois de minha morte. Te saúdo, guerreira.”
Lembro de como ele se ajoelhou à minha frente e beijou o punho de minha espada no sinal mais antigo de respeito e submissão às guerreiras.
Ele viveu ainda por muitos anos, já não era o mesmo homem e era difícil colocar um sorriso em seu rosto, mas continuou um ferreiro admirável e até sua morte me presenteou com uma espada a cada ano e a cada visita que eu lhe fazia entre minhas viagens de aprendizado, me dava mimos como adagas, facas, punhais, todos regiamente trabalhados. Era sua maneira de me dizer que se orgulhava de meu caminho. Havia pouco que eu pudesse para retribuir sua eterna dedicação, mas conseguia faze-lo sorrir quando passava tardes com ele forjando o aço e contando das terras que havia atravessado.
Ele se foi em um entardecer de outono, muito parecido com aquele em que minha mãe se foi. O sol morria no horizonte manchando a terra e enquanto segurava minha mão e dava seu ultimo suspiro, chamou por aquela com quem finalmente iria se reunir “Helena!”. Pelo seu sorriso sei que ela o atendeu.

4 comentários:

Marina Pavelosk Migliacci disse...

tô adorando esse conto. e divulgando.
o carnaval foi ótimo. em sao luis não pode ser diferente. devo uma visita. ligo esse final de semana e vou ver vcs. saudade
beijos!!!

neferthais disse...

eu tbm me isolo em meus posts, hahaha... nem sei o que acontece no mundo blogueiro... acho q é o trabalho...
encontro literário? interessa muito!!!

Anônimo disse...

Estou voltando ao mundo dos vivos depois de um período de férias, logo vai ter novos posts no meu blog. Continue Visitando.

dade amorim disse...

Menina, passei por aqui caladinha, mas você me viu :)) Ainda descubro o porquê de tanta tristeza! Mas enquanto isso não acontece, boas histórias!
Beijo.